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segunda-feira, agosto 06, 2012

Fundamentos da Sociologia

FUNDAMENTOS SOCIOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA Não há pretensão, aqui, de esgotar o tema. A função do presente texto não é aprofundar teorias sociológicas ou realizar abordagens academicistas que nos coloquem distantes da realidade em que vivemos. Estudos desse estilo, certamente os encontramos em bibliotecas ou livrarias. Nosso propósito, ao contrário, é suscitar um debate democrático e solidário sobre a realidade, apontando algumas pistas rumo a metodologia que possam provocar mudanças pessoais e coletivas, gerando comunhão e participação, na formação de uma sociedade autônoma, dona de seu destino. Tenho certeza que podemos pensar as coisas pelo menos sob dois enfoques. Ou pensar as coisas da educação, da realidade, do mundo, do ser humano, da cidadania, da vida, do ponto de vista funcionalista-positivista, ou pensá-las dialética-histórica-criticamente. Aqui entra o papel da reflexão os Fundamentos Sociológicos da Educação. Aprofundar essas duas concepções ou teorias em sala de aula é fundamental. Mais: buscar caracterizar como se dão, na prática, estas duas teorias é questão emergencial. Aprofundemos um pouco estas questões. O que significa uma sociedade adestrando seus cidadãos para a assimilação, na prática, do discurso positivista? As coisas estão postas, a educação está posta, é assim que correrá o seu curso. A sociedade está organizada de maneira tal, que tudo o que acontece, acontece de modo funcional. O ser humano vai internacionalizando, introjetando esta concepção de mundo. Dela vai decorrer uma prática submissa, intimidada, de perda de identidade, de perda da historicidade, de moralismo exacerbado e autoritário, repressivo e opressivo. A Escola cumpre o papel de censor, reprimindo, punindo, suprimindo os sonhos e as buscas. Uma abordagem séria sobre nossa realidade nos permitirá perceber que o modelo sócio-político que temos implantado é um modelo fundamentado no “caldo” ideológico do positivismo. Aliás, não é difícil imaginar e entender a razão histórica para tantos regimes de extrema-direita se terem instalado na América Latina contemporânea. Não é acaso a utilização de um aparato repressivo, seja ele jurídico ou militar, como forma de legitimar o modelo que se pretendia impor ao Continente, opondo a “lei da força” à “força da lei”. Já se disse, com muita propriedade, que, em toda a dimensão política, existe a ação pedagógica; que toda a dimensão pedagógica subjaz uma ação política. A ausência de um caráter crítico da organização e da participação, a apatia e o conformismo são sinais claros do modelo que busca impedir o acesso do cidadão à sua plena maturidade política, prática marcada pela liberdade. Penso que temos aqui um grande tema de discussão em sala de aula. Por que não estudar, com nossos educandos, temas como: alienação da juventude, opressão x cidadania no contexto brasileiro e Latino-americano? Por que não aprofundar, com eles, as saídas que os povos vêm encontrando rumo à sua maturidade? Quando trazemos para a sala de aula Movimentos pelos direitos da mulher, da cultura negra, de defesa das nações indígenas, de organização do meio popular, de organização do meio estudantil, estamos apontando para novas saídas, para uma sociedade que quer tomar a história na mão e ter plena consciência da cor do seu destino. Estes estudos podem perfeitamente ser feitos a partir de pesquisas, de painéis, de seminários, de contato concreto com a realidade de cada segmento. Quando a isso nos propomos, estamos fazendo sociologia? Se quisermos uma resposta acadêmica, diria que não. Se buscamos, porém, com nossos alunos, o estabelecimento da relação entre a função da sociologia e da escola como processo de socialização, de formação da cidadania, não temos como deixar de caminhar rumo a esta postura de trabalho. São perguntas significativas, das quais não temos o direito de abdicar: a quem queremos formar? Para quem formamos? Que horizontes descortinamos? Que visão de realidade temos? Que interpretação da sociedade fazemos? Espontaneísta? Crítica? O que buscamos com nosso fazer pedagógico? Na verdade, nossa prática didático-pedagógica, explícita ou implícita, afirma, queiramos ou não, toda nossa concepção de sociedade, de política, de mundo. Na perspectiva de um currículo emancipador, a sociologia da educação torna-se vital para provocar uma discussão científica, que faça uma interpretação competente, sistemática e orgânica da realidade, que possa permitir que as demais disciplinas de um curso de formação de magistério, como as didáticas, possam apontar para saídas de um projeto educacional formador de cidadania. Por isso, a Sociologia da Educação se insere nos Fundamentos da Educação, fundamentos que nos lembram: base, referência, paradigma. Olhando para a prática de todos nós, educadores brasileiros, penso que nos falta, ao fazermos educação, olhar para o homem e olhá-lo num processo de relações afetivas, agindo, interagindo na sociedade. Acredito que somente quando assumirmos, na prática, o específico que nos cabe fazer na transformação da sociedade, seremos partícipes e co-autores da Utopia. Cabe-nos ser competentes didática e pedagogicamente. Esta é a nossa função, esta é a nossa contribuição ao mundo do trabalho, onde também se dá a formação do homem como sujeito de direitos, sujeito de dignidade, construtor da solidariedade. Aqui, apontamos para uma outra dimensão essencial em nossa prática. Magistério, bico ou profissão? Na educação das séries iniciais, onde se encontra parte dos meus alunos, o educador não pode escapar desta discussão. Como falar em Direitos às crianças, como apontar a liberdade e a dignidade como valores de vida, se não estou convencido desta opção na minha própria vida? Se a Escola é lugar onde se fazem e se produzem relações humanas, será nesse local que se gestará a mudança, a vida, a liberdade, na vivência do cotidiano. Caso contrário, haverá de ser um espaço onde começaremos a perpetuação da opressão, da desigualdade, da exploração, da omissão... não existe neutralidade. Ou somos a favor do homem, ou seremos a favor de ideologias, de sistemas opressores que se apropriarão do destino deste homem em nome de leis, tradições, estruturas. Educar o social. Deixar que o social interpele e questione o educando. Educação e cidadania são coisas que convergem. Educar o cidadão para que seja autor de seu destino, para que assuma a sua dimensão histórica, cuidando da vida, da sua, dos outros, de todos, numa dimensão horizontal. Cidadania: dizer não à repressão, dizer não à escravidão, dizer sim à liberdade de expressão, à vivência da solidariedade, à construção comunitária de uma experiência de prática política de autonomia, de reciprocidade, de cooperação e de responsabilidade. Quando promovemos, em sala de aula, um seminário sobre conjuntura nacional, aprofundando questões angustiantes da realidade brasileira, quando somos capazes de analisar suas causas e efeitos, quando somos capazes de discernir saídas, estamos discutindo e aprofundando a compreensão da sociedade, suas relações, a questão do poder, a necessidade da mudança. É impossível discutir cidadania, pensar a realidade globalmente, sem pensar e discutir a realidade da fome, da saúde, das condições de trabalho... Urge que os Fundamentos da Educação estejam comprometidos com uma proposta que coloque a defesa da vida como valor maior da nossa ação pedagógica. É preciso pensar o homem como sujeito de direitos: direito à alimentação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à expressão política, ao salário justo, direito à habitação, à livre expressão, à livre organização, à escolha livre de um credo ou não... Estes são caminhos para a formação da consciência e de uma prática solidária. Na minha experiência pessoal de formação de adolescentes, futuros educadores, tenho tido o cuidado e a insistência de cultivar as chamadas atitudes de fundo, a tão fundamental sensibilidade, a solidariedade, a bondade. Somente quando mergulhamos na ótica de uma educação pelo “mais”, conseguiremos provocar uma atitude que conduza ao inconformismo e à mudança. É preciso oportunizar situações concretas em sala de aula para este tipo de vivência. Nem sempre nos damos conta de que, embora tendo um conteúdo crítico, nossa prática é autoritária e domesticadora. O cultivo destas atitudes de fundo vai se dando na forma de como organizamos o espaço em sala de aula: democrático, gerador de comunhão e participação; e no modo como nos relacionamos no cotidiano com nossos educandos. As estratégias de como decidir cooperativamente os critérios norteadores de avaliação (temida e odiada), a forma de como planejamos o trabalho e o modo de como socializarmos e envolvemos cada aluno são maneiras de respaldar o discurso explícito manifesto numa prática implícita. Certamente não estou dizendo nenhuma novidade. Pelo menos em algum momento já pensamos nisso. A verdade, porém, é que não fazemos isto. E nossos alunos dos cursos de magistério, ao saírem, continuam a repetir as mesmas práticas domesticadoras e bancárias, verticalistas, porque contribuímos também para isto. A Sociologia da Educação deve propiciar a percepção da relação intrínseca entre a prática da liberdade – expressão da libertação – e o projeto sócio-político que a referencia e a norteia. É preciso discutir e aprofundar o mito de que as mudanças sociais dependem da Escola. Hoje, é preciso rever esta posição. Uma sociologia positivista até que ajudaria a sustentar este mito. Não queremos isto. A Escola tem o seu papel no processo de mudança, mas os meios de socialização são os mais variados possíveis